terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Num dia de folga...

365 dias do ano trabalhando sem parar, isso quando não tem 366. Todos tem seus calendários marcados, com feriados, natal, aniversário, dia dos namorados, ano novo, páscoa etc, etc e etc. Menos ele, o Super- Herói. Dia após dia é a mesma coisa, acorda bem cedo e dorme muito tarde, mas, talvez dormir seja um luxo, ao qual nem sempre dispõe. Já que tinha que estar disfarçado, e para sobreviver como qualquer pessoa normal, tinha que ter um emprego, um chefe daqueles, e dentre tantos poderes o maior era o da paciência, engolindo cobras e lagartos calado. Se seu chefe descobrisse com quem estava falando, talvez nunca mais o contrariasse, pelo simples fato de temer que sua empresa fosse demolida num piscar de olhos.
Festas? Confraternizações? Ele mal sabia o que era isso, estava o tempo todo ocupado, salvando o mundo. Então ele começou a notar que de tempos em tempos os vilões não atacavam, e o serviço que lhe restava era de evitar algum acidente. Um dia todos os vilões já tinham sido liquidados, ele pensou que teria um descanso, só então descobriu que estava enganado, os acidentes continuavam, assaltos, crimes cometidos por meros mortais. Seu trabalho não acabou. Nenhum obrigado, nem nada, era apenas mais um serviço, mais uma coisa comum do dia a dia.
Numa noite sentou-se numa pedra, olhou para a cidade e refletiu:
- Todas as pessoas tem férias, descansam, mas eu não. Apesar dos meus superpoderes eu me sinto cansado e estressado. Vou tirar um dia de folga, não é possível que o mundo vá desabar em apenas um dia.
Sobrevoando a cidade foi até seu apartamento, fez suas malas e saiu. Alugou um chalé bem longe da sua cidade, e pela primeira vez em todos seus anos de herói, pode dormir bem.
Ele mal via a hora de voltar pra casa, saber como estavam indo as coisas. Seu dia terminou, hora de voltar. Chegando na cidade, percebeu uma multidão revoltada. Ele na posição de um cidadão normal, perguntou o que estava acontecendo.
- O nosso Super- herói nos abandona quando precisamos dele, olha o que aconteceu; Muitas pessoas estão feridas na avenida, por causa de um acidente, e ele não estava aqui para socorrê-las. O banco foi roubado, deu uma chuva daquelas e inundou a cidade, tem crianças no hospital, os políticos abusam do poder, e onde está ele?
Pelo jeito, a coisa não estava boa. Foi para a casa, colocou seu uniforme e foi atender áquelas pessoas. Todos o vaiaram, xingavam e brigavam com ele, e antes que ele pudesse dizer algo, decidiram que não precisavam mais de um herói se ele não estaria ali para quando fosse necessário. Então alguém, uma moça olhou para ele, e esbravejando perguntou:
- Você não vai dizer nada?
Em meio aos burburinhos ele começou a falar;
- Eu passei todos os dias da minha vida lutando por vocês, salvando a vida de vocês das garras dos vilões e até de vocês mesmo. Quando os vilões foram liquidados eu pensei que teria uma folga, eu me enganei, continuei na luta como sempre, não ouvi um obrigado sequer. Eu também tenho as minhas necessidades, mas fui deixando de lado para cuidar de vocês. Um dia apenas que eu saí, e vocês só notaram minha ausência porque aconteceram essas catástrofes, e eu não estava por perto. Disseram que não precisam de um super herói, eu concordo, só o que precisam é pensar uns nos outros. Esse acidente não teria acontecido, se o motorista não tivesse ingerido bebida alcóolica, o banco talvez não teria sido roubado se os guardas estivessem a postos, mesmo roubado vocês tem policiais para quê? A cidade não estaria alagada se vocês não jogassem lixo pelas ruas, se as crianças estão no hospital, e eu ainda nem sei porque, mas os pais poderiam estar cuidando delas ao invés de saírem para festar e deixa-los sozinhos em casa, como eu já vi muitas vezes. E se os políticos roubam, ou tiram proveito do poder que lhes foram concedidos vocês são os responsáveis, nas eleições os corruptos estão fazendo sua campanha para se reeleger, e sabem por quê eles conseguem? Porque vocês os colocam lá denovo, vendem seus votos, sua dignidade, sua segurança e respeito. Vocês são a maioria, vocês o colocaram lá, então cobrem deles. A realidade é que vocês já estão acomodados...
Nesse momento todos olham para ele, num misto de espanto e indignação com o que ouviam.
- Vocês acostumaram que uma pessoa faça tudo por vocês, que vigiem enquanto vocês dormem, que cuide da tranquilidade enquanto fazem festas até altas horas, incomodando os seus vizinhos, que no dia seguinte a cidade esteja um brinco para que possam suja- la, que seus filhos estejam bem enquanto estão se divertindo num bar ou boate com os amigos ou conhecidos, que não venha ter nenhum atentado enquanto vocês se provocam, que a cidade esteja em paz enquanto assistem a novela ou o futebol numa tela plana. Eu vou embora, vocês não precisam de um herói para consertar as suas mancadas. É hora de crescerem e cuidarem de si mesmos. De hoje em diante não existirá herói, vocês serão seus próprios heróis, e fico mais tranquilo, por saber que essa decisão não partiu de mim, eu apenas concordei.
Logo depois o super partiu, deixando todos no centro da cidade, alguns desacreditados e outros com medo, mas, palavra é palavra, e assim foi. Nada mais de herói, nem superpoderes, as pessoas tinham que acreditar nos seus poderes, de ajudar uns aos outros, cuidar uns dos outros.

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